Relatório da visita ao

Observatório óptico de Ostrowik

e ao

Rádio-Observatório de Torun

 


Angelino Gonçalves
Laurindo Sobrinho


Universidade da Madeira
Departamento de Física

STORM

Julho 1997


Observatório óptico de Ostrowik

1 - Introdução

A escassos 40 km a sudeste de Varsóvia fica situado o observatório astronómico óptico de Ostrowik. Embora o telescópio aí instalado seja de pequena dimensão ( 35 cm de abertura ) e um pouco antiquado face aos padrões actuais, continua a ser utilizado por alguns astrónomos e alunos da Universidade de Varsóvia em trabalhos de investigação.

O telescópio é essencialmente utilizado na pesquisa e estudo de estrelas variáveis em enxames abertos. Durante a semana em que visitámos o observatório, ( 16-07-97 a 22-07-97 ), tivemos a oportunidade de assistir algumas sessões de observação efectuadas por alunos da Universidade de Varsóvia e discutir com os mesmos vários aspectos relacionados com o trabalho que estavam a efectuar e também de uma forma mais geral, com o observatório e telescópio.


2 - Câmaras C.C.D

O registo de uma observação astronómica realizada por um telescópio óptico pode ser registada num filme fotográfico com sensibilidade apropriada. Contudo, actualmente utilizam-se para esse efeito câmaras C.C.D.. Estas câmaras são constituídas por uma placa onde existem pequenos transístores cada um deles correspondendo a um elemento de imagem ( pixel ). Assim a resolução da imagem depende do numero de transístores existentes. No caso da câmara C.C.D. utilizada em Ostrowik a resolução é de 500 * 500 o que permite obter imagens com 5 minutos de arco.

Cada transístor tem a si acoplado um condensador. Quando 1 fotão embate num determinado transístor este deixa passar uma corrente e consequentemente temos um aumento de carga no condensador correspondente. Os condensadores funcionam assim como contadores de fotões. Quando um condensador fica saturado (cerca de 60 000 contagens ) derrama o excesso para os condensadores vizinhos, borrando a imagem.

Para evitar isso é necessário ter em conta a magnitude do objecto a observar e a sensibilidade da câmara por forma a escolher o tempo de exposição mais correcto. No caso de Ostrowik observações de objectos mais brilhantes que a magnitude 7 são praticamente ineficazes.

Finda uma exposição o computador lê o conteúdo de todos os condensadores e apresenta o resultado no écran a preto e branco. Um pixel será tanto mais branco quanto maior for o conteúdo do condensador correspondente.

A câmara C.C.D. deve funcionar a uma temperatura da ordem dos 30ºC negativos, evitando-se assim a presença de correntes adicionais nos transístores devido ao aquecimento. Para atingir essa temperatura é utilizado um sistema refrigerador que bombeia através de tubos isoladores um liquido apropriado que circula pela câmara C.C.D . Uma vez ligado o sistema de arrefecimento, com a câmara à temperatura ambiente, são necessárias cerca de duas horas para estabilizar a mesma nos 30ºC negativos.


3 - FLAT , BIAS e DARK

Antes de dar inicio às observações astronómicas propriamente ditas é necessário efectuar três tipos de exposições que nos vão ajudar a extrair impurezas e ruído presentes na imagem. O primeiro tipo de exposição a efectuar é o FLAT. Esta exposição de cerca de 0.1 segundos é efectuada com a câmara C.C.D. aberta e quando o céu ainda esta claro, com o telescópio a apontar para uma região do céu sem nuvens. Pretende-se com este tipo de exposição identificar as manchas de sujidade e partículas de poeira presentes nos espelhos e filtros do telescópio. Normalmente são efectuadas várias exposições do tipo FLAT por forma a eliminar a presença de qualquer raio cósmico, estrela ou planeta que porventura possa surgir nalguma das exposições.

O segundo tipo de exposição é o BIAS. Trata-se de uma exposição instantânea ( 0 segundos ) efectuada com a câmara fechada. O objectivo é obter a sensibilidade de cada um dos transístores da máquina.

Por fim temos a exposição do tipo DARK, que é análogo ao tipo BIAS só que neste caso a duração é de alguns minutos. Pretende-se com esta exposição obter a evolução da sensibilidade de cada um dos transístores com o tempo. Normalmente essa evolução é linear até um limite de 60 000 contagens.

As exposições do tipo BIAS e DARK devem ser sempre efectuadas antes e depois de cada observação propriamente dita devido à influência da temperatura sobre a câmara.


4 - Efectuando observações

Uma vez seleccionado o objecto a observar recorre-se a uma base de dados que fornece as respectivas coordenadas para o ano 2000. Com base nessas coordenadas e na data actual o computador calcula a presente localização do objecto. Posto isto podemos apontar o telescópio para essa posição e ligar o sistema " auto-guider ".

O sistema " auto-guider " é constituído por uma câmara auxiliar que faz fotos a intervalos regulares de uma das estrelas mais brilhantes da zona em estudo. Ao fim de cada foto o sistema compara esta com a anterior e procede à correcção automática da posição do telescópio, mantendo essa estrela mais brilhante sempre no centro. Deste modo é possível seguir um dado objecto durante vários minutos.

No caso de surgir qualquer nebulosidade o sistema pode perder o rasto da estrela e nesse caso temos uma mensagem de erro acompanhada de um sinal sonoro. Se a nebulosidade desaparecer logo de seguida, podemos tentar apanhar de novo o rasto da estrela usando apenas meios eléctricos. No entanto se já decorreu muito tempo e a estrela já se afastou demasiado da ultima posição em que foi vista, será necessário orientar o telescópio recorrendo a meios manuais.

Consoante o objecto a observar e o tipo de imagem pretendido usam-se diferentes combinações de filtros. Estes são introduzidos manualmente no telescópio, sendo também necessário informar o computador sobre os filtros utilizados.

Quando um raio cósmico incide sobre a câmara C.C.D. produz um ponto na imagem ou um pequeno traço consoante o ângulo de incidência. De uma forma geral não é fácil distinguir na imagem o raio cósmico de uma estrela. No entanto comparando várias imagens da mesma região podemos eliminar os raios cósmicos.

As imagens obtidas em cada observação, bem como as exposições do tipo FLAT, BIAS e DARK são armazenadas primeiramente num disco rígido. Cada imagem ocupa cerca de meio megabyte pelo que não é prática a transferência posterior dessas imagens para disquete. Usam-se então fitas magnéticas pois estas podem armazenar dezenas de imagens. Por razões de segurança é feita uma segunda cópia. A imagem final de um dado objecto obtém-se combinando as várias exposições desse objecto com as exposições do tipo FLAT, BIAS e DARK através de software apropriado.

Todo o equipamento utilizado no observatório é bastante sensível pelo que existe um sistema estabilizador para proteger o equipamento contra possíveis flutuações de corrente. Alem disso existe uma bateria que é ligada automaticamente no caso de um corte de energia eléctrica.


5 - Estudo de estrelas variáveis

O observatório óptico de Ostrowik é utilizado essencialmente no estudo de estrelas variáveis pertencentes a enxames abertos. Uma vez identificada uma estrela variável é preciso determinar o respectivo período. Para isso deve ser feito um estudo exaustivo da estrela ao longo de várias noites. Deve também ser feito o registo da curva da magnitude aparente da estrela ao longo do período. Depois pode também ser realizado um estudo estatístico de longo termo, com sessões de observação menos frequentes, cujo objectivo é confirmar os resultados obtidos ou detectar possíveis alterações. 

Quando visitámos Ostrowik estava a ser observado o enxame aberto NGC 6834 com a finalidade de estudar o comportamento de uma estrela variável identificada recentemente por aquele observatório.


6 - Visibilidade em Ostrowik

Durante o período em que permanecemos em Ostrowik podemos constatar as condições de visibilidade do céu nocturno naquela região do globo. Verificámos que contrariamente ao que se passa na ilha da Madeira não conseguimos identificar a olho nu estrelas de magnitude 6. Além disso a faixa nebulosa da via Láctea era muito pouco visível. Por outro lado o facto de Varsóvia ficar apenas a alguns quilómetros a noroeste do observatório contribuía para que o céu nessa direcção não apresenta-se quaisquer condições para uma boa observação astronómica.

Outro ponto a considerar é o facto do observatório estar situado numa planície o que faz com que qualquer nebulosidade atmosférica existente fique sempre acima do nível do observatório, dificultando assim a observação. Embora as condições de observação em Ostrowik não sejam das melhores, são suficientemente boas para que se realizem observações astronómicas de utilidade científica e se publiquem artigos baseados nessas mesmas observações.


 

Rádio-Observatório de Torun

1-Introdução

A noroeste de Torun ( cidade localizada no norte da Polónia, na qual nasceu o célebre astrónomo Nicolau Copérnico ), perto da localidade de Piwnice, fica situado o rádiobservatório da Universidade de Nicolau Copérnico. Naquele complexo está instalado um rádiotelescópio de 30 m de abertura designado por RT4 e/ou Nicolau Copérnico, o qual é utilizado no estudo de pulsares e de outras fontes de rádio galácticas ou extra-galácticas.

Durante a nossa visita de trabalho ao rádiobservatório, entre os dias 24-07-97 e 29-07-97 tivemos a oportunidade de :

·      Visitar as instalações com especial destaque para a sala de observações onde nos foi explicada a função de cada um dos equipamentos ai presentes.

·      Visitar o próprio RT4, subindo a sua estrutura até o topo, tomando assim contacto com os vários mecanismos eléctricos e mecânicos existentes.

·      Assistir ao trabalho de alguns astrónomos que observavam pulsares, quasares e linhas espectroscópicas.

·      Fazer as nossas próprias observações de pulsares.

·      Assistir algumas sessões teóricas proferidas pelo Prof. Marek Demianski, o qual nos forneceu também alguma documentação sobre pulsares e rádiotelescópios.

Neste trabalho começamos por fazer uma breve introdução teórica ás estrelas de neutrões e pulsares, focando depois os meios e métodos utilizados no estudo do sinal. Por fim apresentamos as nossas próprias observações e resultados.

Todas as actividades desenvolvidas durante a visita ao rádiobservatório foram orientadas pelo Prof. Marek Demianski ao qual estamos profundamente gratos.

  

2-Da sequência principal à estrela de neutrões

Todas as estrelas passam pela sequência principal, fase da vida da estrela onde se dá a conversão do hidrogénio em hélio, através de uma série de reacções nucleares. O hélio formado acumula-se no centro da estrela. Assim, numa estrela da sequência principal existem duas partes bem distintas: um núcleo de hélio em contracção e um envolucro de hidrogénio onde continuam a ocorrer reacções nucleares. Haverá um ponto a partir do qual o envolucro dilata e consequentemente esfria. A estrela passa para a fase de gigante vermelha.

A temperatura do núcleo da estrela continua a aumentar até se iniciar a conversão do hélio em carbono. Dá-se assim início à formação de um núcleo de carbono, rodeado por um envolucro de hélio em combustão. O processo poderá continuar com a conversão do carbono em oxigénio e assim por diante. Algumas das reacções nucleares ocorridas libertam neutrões. Estes podem integrar-se com certa facilidade nos núcleos atómicos contribuindo assim para a síntese de elementos pesados, inclusive núcleos radioactivos. Assiste-se assim a um ciclo infernal que poderá levar à explosão da estrela em supernova.

As camadas exteriores da estrela são assim ejectadas para o meio   interestelar. O núcleo remanescente continua a colapsar atingindo-se densidades equivalentes à do núcleo atómico. Nesta fase protões e electrões combinam-se de forma a produzir neutrões, libertando neutrinos:

                                     

O destino final da estrela depende da sua massa inicial. Se esta for superior a 3.2 massas solares, teremos um buraco negro, caso contrário temos uma estrela de neutrões

  

3-Pulsares

Os pulsares foram descobertos em 1967, como objectos que emitiam radiação em vários comprimentos de onda com pulsos periódicos, bastante pequenos. Além disso o período do sinal aumentava constantemente de uma forma bastante previsível. Mais tarde apurou-se que essa previsibilidade podia ir até a ordem dos nanosegundos.

Os pulsares deveriam estar associados a estrelas de neutrões e/ou anãs brancas, sendo a presença periódica do pulso uma consequência do respectivo movimento de rotação. Cálculos teóricos mostraram que as anãs brancas não poderiam apresentar velocidades de rotação tão altas, como as que se atribuíam aos pulsares, pelo que estes devem estar associados apenas a estrelas de neutrões.

Assim os pulsares são estrelas de neutrões que rodam com alta velocidade e emitem fortes pulsos de rádio periódicos, detectáveis na Terra. Os intervalos de repetição do pulso variam entre 1.5 ms  e  5 s  consoante os pulsares. O pulso corresponde normalmente de 1 % a 5 % da duração do período.

A alta velocidade de rotação associada a uma estrela de neutrões é uma consequência da conservação do momento angular. Quando se forma uma estrela de neutrões, sempre através de uma supernova, temos uma diminuição da massa e do raio relativamente à estrela inicial. Como a diminuição do raio é muito mais drástica que a da massa, há um, não menos drástico, aumento na velocidade de rotação.

A maioria das estrelas têm um campo magnético associado. Por exemplo no caso do Sol é 1 Gauss (109 Gauss nas manchas) . A crusta das estrelas de neutrões é essencialmente composta por ferro, o qual na presença do campo magnético da estrela é magnetizado aumentando ainda mais o valor do campo.

Considerando as estrelas de neutrões como dipólos magnéticos, é  possível calcular os respectivos campos magnéticos. Os valores típicos rondam os 1012  Gauss, embora para os pulsares de milisegundo esses valores sejam da ordem de 109  Gauss.

Nem todos os pulsares retardam a sua velocidade de rotação. Quando temos uma estrela de neutrões num sistema binário e esta recebe um fluxo de massa vindo da outra estrela do par, temos um aumento da velocidade de rotação acompanhada da emissão de raios-x. Todos os pulsares de raios-x observados até o momento aceleram.

Para explicar a emissão de ondas de rádio por parte dos pulsares não existe ainda uma teoria satisfatória. Existem no entanto dois modelos habitualmente empregues que passamos a descrever resumidamente:

 

3.1-Polar cap model

A diferença de potencial entre 1 ponto da superfície da estrela de neutrões e um ponto próximo acima desta pode atingir valores da ordem dos  1012  Volt. Esta tensão é suficiente para extrair algumas partículas à superfície acelerando-as ao longo das linhas de campo a velocidades relatívisticas.

Devido a essa aceleração são libertos fotões de alta energia, os quais podem dar origem à criação de pares partícula-antipartícula, nomeadamente pares electrão-positrão.

Este processo aumenta ainda mais a referida diferença de potencial, podendo ocorrer uma descarga sobre a superfície da estrela, aquecendo a zona de impacto. Numa segunda descarga a probabilidade de ser atingida a mesma região da superfície é superior à probabilidade de ser atingido qualquer outro ponto.

Formam-se assim então sobre a superfície anéis, concêntricos com o eixo do campo magnético, sobre os quais as descargas são mais frequentes sobre uns anéis do que sobre outros. O facto de um pulsar apresentar um ou mais picos depende do número de anéis intersectados pela linha de visão do observador.

O ponto fraco do modelo reside no facto de não explicar convenientemente como se dá a conservação da carga eléctrica da estrela.

 

3.2-Modelo de plasma

Temos um cilindro de luz à volta da estrela com o eixo do cilindro a coincidir com o eixo de rotação da estrela. A fronteira do cilindro é o limite a partir do qual nada pode escapar, nem sequer a luz. Segundo este modelo no interior do cilindro de luz existe plasma, o qual ao rodar sob a acção do campo magnético emite radiação.

Em princípio essa radiação não pode abandonar o cilindro. No entanto alguns fotões de alta energia emitidos mesmo sobre a fronteira interior do cilindro conseguem escapar à custa da perda de grande parte da sua energia, pelo que o observador, no caso geral, apenas detecta o fenómeno na banda do rádio.

A emissão de fotões será  muito mais intensa junto ao eixo do campo magnético pois só ai o plasma atinge velocidades relativistas. Assim vemos o pulso sempre que a estrela dá uma volta e um dos pólos magnéticos fica na linha de visão do observador. O ponto fraco deste modelo é o não explicar a existência de picos múltiplos em alguns pulsares.

 

4-Glitches

Ocasionalmente os pulsares podem exibir uma alteração repentina no aumento regular do respectivo período. A este fenómeno, ainda poucas vezes observado, foi dado o nome de glitch. Embora não exista uma teoria definitiva sobre o fenómeno é possível descrever em traços gerais aquilo que é suposto conduzir ao mesmo.

Todos os componentes da estrela de neutrões à excepção do superfluído interior, estão fortemente ligados por mecanismos electromagnéticos à rotação da crusta. À medida que a estrela de neutrões envelhece, troques externos, agindo sobre a crusta, fazem com que esta diminua a sua velocidade de rotação. Há sempre uma certa transferência de momento angular entre o superfluído e a crusta. Quando a diferença de velocidades de rotação entre superfluído e a crusta ultrapassa um determinado valor critico, temos uma transferência catastrófica de momento angular cuja consequência será um aumento observável na frequência do pulso.

O período pós-glitch caracteriza-se por um decrescimento da velocidade de rotação mais rápido do que o habitual, até que ao fim de algumas semanas o decrescimento poderá voltar para o seu valor anterior.

Julga-se que devem ocorrer glitches em todos os pulsares. No entanto são raros os pulsares onde já se observavam glitches por mais do que uma vez. O estudo do processo que leva à ocorrência de um glitch, bem como do período pós-glitch fornece importantes pistas para a compreensão do interior das estrelas de neutrões.

 

 

5-Leitura e registo do sinal dos pulsares

O sinal emitido por um pulsar chega-nos acompanhado de ruído que pode ser mais ou menos intenso. Esse ruído pode ter origem exterior ( ruído galáctico) ou local (por exemplo interferências causadas por emissores de rádio). Uma das principais características de um pulsar é o respectivo pulso. Este está presente numa vasta região da banda de rádio, embora com diferentes intensidades, como se pretende ilustrar com a figura seguinte:

 

 

Em condições ideais seria este o sinal recebido pelo rádiotelescópio, no entanto devido à inevitável presença do ruído o sinal obtido é bastante diferente, apresentando oscilações relativamente grandes e por vezes alguns picos estreitos e bastante intensos (interferências locais ). A figura seguinte mostra a forma típica do sinal obtido:

 

 

O primeiro passo para obter uma boa leitura do sinal de um pulsar será a procura de um intervalo de frequências dentro do qual o sinal do pulsar seja forte e o ruído o menos intenso possível. Esse intervalo pode ter uma largura típica de 640 Mhz ( note-se que a largura de toda a banda de rádio é muito superior ).

Outro factor a ter em conta é a dispersão da luz provocada pelo meio interestalar. No espaço entre o pulsar e o observador poderão existir nuvens de gás ou poeira e nesse caso teremos um sucessivo atraso do sinal à medida que o comprimento de onda aumenta.

Assim ao estudar o sinal numa janela tão vasta como 640 Mhz torna-se necessário ter em linha de conta o atraso do sinal. Isso faz-se dividindo a janela em vários canais suficientemente estreitos de modo a que o atraso do sinal dentro de 1 dado canal não seja significativo.

Como já foi referido anteriormente, o período dos pulsares aumenta de forma muito previsível devido ao decréscimo da velocidade de rotação do pulsar. Do ponto de vista do observador há a considerar também a variação relativa do período do pulsar devido ao movimento do observador (rotação da Terra ) e também devido ao movimento do próprio pulsar se este pertence a um sistema binário.

Todas estas variações no período podem ser determinadas com um rigor que pode ir até a ordem dos nanosegundos pelo que o hardware e o software utilizados devem ter em conta este facto. Assim é utilizado um relógio atómico de alta precisão, o qual alem de indicar a hora exacta (até a ordem dos nanosegundos pelo menos ), emite um impulso regular que tem por finalidade sincronizar o funcionamento de todo o hardware e software.

O hardware utilizado na leitura e armazenamento do sinal é composto pelos 3 sistemas sumariamente descritos a seguir:

5.1-Multiplexer A\D

Os sinais captados pelo rádiotelescópio são canalizados para um ou mais sistemas multiplexer A\D cada qual com um determinado número de canais. A amostra de sinal presente em cada canal é então digitalizada e enviada logo de seguida para o sistema “signal averager”, ficando o multiplexer A\D livre para tratar nova amostra. O processo pode repetir-se milhões de vezes por segundo, isto é, podem ser consideradas amostras até a ordem dos microsegundos.

5.2-Signal averager

Este sistema é constituído por uma memória onde são armazenados os sinais digitalizados pelo multiplexer A\D. Existe uma posição de memória por canal por amostra. Na realidade o sinal não é simplesmente armazenado, mas sim adicionado ao já existente.

Existe uma memória paralela onde são contabilizadas o numero de leituras adicionadas por cada canal e por cada amostra. Em geral esse numero será o mesmo para todos os casos, no entanto, é possível activar uma espécie de filtro que avalia a qualidade de cada amostra podendo rejeitá-la ou não, variando assim o numero de amostras adicionadas em cada caso.

Uma vez terminada uma integração (leitura do sinal ao longo de um dado numero de períodos ) os dados armazenados no “signal averager” são enviados para o computador central e gravados em disco. Só depois então pode ser iniciada nova integração.

5.3-Frequency synthesizer

A continua variação do período dos pulsares requer que o intervalo de tempo por amostra seja continuamente actualizado por forma a manter o mesmo numero de amostras por período durante uma integração. O sistema “frequency synthesizer” controla esse intervalo de tempo.

  

6-Observando pulsares

A observação de 1 pulsar (previamente catalogado) é uma operação praticamente automática. Uma vez indicado o nome do pulsar a estudar, resta ao operador monitorizar o sistema. O controlo de toda a operação é feita aos comandos do computador central. A seguir indicamos uma sequência de comandos típica na observação de pulsares, explicando em cada caso o respectivo significado:

RT4 - Seleccionar o rádiotelescópio numero 4.

PS C=1508+55 - indicar o nome do pulsar a observar. Após este comando o computador central controla os motores do rádiotelescópio de modo a orientar este para o pulsar escolhido. No écran, podemos ver a velocidade de cada um dos motores, as coordenadas do pulsar e as coordenadas do radiotelescópio. Quando as coordenadas se igualarem, o radiotelescópio está devidamente orientado.

FIELD SYSTEM - Acesso a informação sobre o sistema.

TSYS - Obter a temperatura do detector. Convém que seja uma temperatura bastante baixa, á volta de 40 K de modo a reduzir o nível de ruído provocado pela vibração do material usado como detector.

PSPM2 - Seleccionar programa de estudo de pulsares .

Abort , monitor , LCP2 , RCP2 , LCP1 , RCP1 - Existe uma janela que nos dá constantemente o nível médio do sinal em cada um dos 64 canais. Quando o pulsar é bastante intenso e/ou há bastante ruído, alguns canais podem ficar saturados. Neste caso é necessário reduzir o nível do sinal incidente para a gama de funcionamento do detector. Pode dar-se também o caso contrário e ser necessário levantar o nível médio dos canais. Esse controlo é exercido através dos comandos RCP e LCP seguidos de um factor apropriado. O ideal será um nível alto mas não saturado.

TIMING -  Ordenar ao computador que inicie a integração do sinal.

1508+55 -  O computador volta a pedir o nome do pulsar e de seguida inicia a integração do sinal.

STOP - Indicar ao computador que pare no fim da presente integração. Se este comando não for utilizado ele inicia nova integração.

Durante a integração é possível visualizar o estado corrente do sinal na sua globalidade ou ainda dividido em 2,4,8,16,32 ou 64 canais. Esta possibilidade é particularmente útil para verificar a qualidade do sinal e, se for caso disso, decidir-se pela interrupção da observação. De referir que  a apresentação do sinal em 2,4,8,16 ou 32 canais destina-se apenas a efeitos de visualização.

No fim de cada observação é necessário indicar no livro de observações o nome do pulsar, data e hora universal e numero de integrações efectuadas.

Nalgumas situações pode não ser necessário recorrer a todos os comandos anteriores. Noutras situações pode ser necessário recorrer a outros comandos não indicados. No entanto durante as observações que efectuamos o procedimento característico era análogo ao descrito anteriormente.

Alem do computador central pode estar ligado um outro computador e um osciloscópio que nos dão informação sobre o nível do sinal. No computador temos acesso à janela de rádio utilizada e no osciloscópio a toda a banda de rádio.

  

7-Observações efectuadas

De seguida indicamos as observações de pulsares que efectuamos, sob a orientação do Professor Marek Demianski, com o rádiotelescópio ' Nicolau Copernico ' (RT4) no rádiobservatório de Torun (Polónia) entre os dias 26-07-97 e 28-07-97 :

 

26-07-97

Psr 2319 + 60

No inicio, embora existindo algum ruído era possível identificar o pulso. Alem disso a temperatura do detector era de 30 K o que é um valor excelente.   Depois  aumentou o nível de ruído e começou a aparecer um segundo pico, tornando-se impossível identificar o pulsar com segurança. Todos os 64 canais apresentavam muito ruído e alguns deles estavam saturados. Resolvemos interromper a observação.

 

Psr 0329 + 54

Embora este pulsar fosse o mais intenso, observável no momento, todos os canais continuavam com muito ruído não sendo possível identificar o pulsar. A temperatura do detector subiu para 66 K ( valor aceitável ). Efectuamos nova tentativa, novamente sem sucesso.

Devido ao elevado nível de ruído ( provavelmente originado localmente ) resolvemos abandonar as observações durante algumas horas. O rádiotelescópio voltou à posição horizontal.

 

Psr 0809 + 74

Continuava a existir muito ruído não sendo possível identificar o pulsar. Verificamos várias vezes a temperatura do detector, mas sempre que implementávamos este procedimento obtínhamos de seguida um sinal com uma cavidade quadrangular:

 

  

Mais tarde ficámos a saber que este comportamento devia-se ao facto de estar activada uma fonte de rádio artificial usada nos testes efectuados ao RT4 ( ainda em fase experimental ).

 

27-07-97

Psr 0329 + 54

Embora com a temperatura do detector a rondar os 80 K, obtivemos um bom resultado. Este é um dos pulsares mais intensos e o seu pulso apresenta alem do pico central, 2 picos menores:

 

 

Ao seleccionar o modo de visualizar em 4 canais verificamos que para as frequências mais baixas apareciam os picos 1 e 2 e para as mais altas os picos 2 e 3. Nas frequências intermédias estavam presentes os 2 picos. Todavia a visualização num único canal mostrava apenas os picos 1 e 2.

Psr 0809 + 74

Começamos por obter um bom resultado. A temperatura do detector rodava os 75 K. Algum tempo depois o ruído aumentou consideravelmente dificultando a identificação do pulsar. Mesmo assim nalguns dos 64 canais ainda era possível ver o pulso.

Psr 1508 + 55

O nível de ruído  baixou um pouco  pelo que foi possível obter um resultado razoável. A temperatura manteve-se.

Psr 1642 - 03

O nível de ruído voltou a aumentar, desta vez consideravelmente pelo que se tornou impossível identificar o pulso. Resolvemos interromper aqui as observações.

 

28-07-97

Psr 0329 + 54

Voltamos a observar este pulsar. Desta vez o nível de ruído era extremamente baixo e foi possível identificar os 3 picos. Durante esta sessão de trabalho a temperatura do detector manteve-se sempre estável abaixo dos 60 K.

Psr 0355 + 54

Embora este pulsar seja bastante fraco, o nível do ruído era de tal forma baixo que obtivemos um resultado bastante bom, aparentemente melhor que o apresentado no catálogo que tínhamos ao nosso dispor. No entanto com o decorrer do tempo o nível de ruído subiu ligeiramente afectando assim os resultados.

Psr 0531 + 21

Resultado razoável, praticamente análogo ao catalogado.

Psr 0540 + 23

Resultado razoável, embora com um certo nível de ruído acima do  catalogado.

  

8-Resultados obtidos

No anexo 1 apresentamos os resultados obtidos. Trata-se na realidade de uma selecção daqueles que apresentam uma melhor qualidade para análise.

Nos gráficos 1 a 5, alem do nome do pulsar é também indicada a frequência central da janela de 640 MHZ e o numero de   '  scan  '   que corresponde ao numero de arquivo dos dados no disco. No canto superior esquerdo temos o sinal do pulsar, uma vez somados os 64 canais. Estes sinais são novamente apresentados nos gráficos 6 a 9.

Voltando aos gráficos 1 a 5, temos no canto inferior esquerdo um quadro onde é descrito o comportamento do sinal em cada um dos 64 canais e no canto inferior direito um quadro com a amplitude média do sinal em cada um dos canais.

Verifica-se que nalguns casos existe uma dispersão mais a menos acentuada da localização do pulso. ( ver PSR 0351+27 e PSR 0355+54 ) Este fenómeno é provocado pela matéria interestelar entre o observador e o pulsar. Assim um estudo cuidado do sinal do pulsar pode revelar importantes características não só do próprio pulsar mas também da composição do meio interestelar.

Aparentemente o sinal do pulsar PSR 0329+54 apresenta um nível de ruído inferior. No entanto esse nível de ruído é da mesma ordem dos restantes. O que acontece é que sendo este um pulsar muito mais intenso do que os restantes, é utilizada uma escala muito mais pequena.

 

9-Conclusão

Trata-se de uma visita de trabalho muito instrutiva, tanto para nós em particular, como para o grupo S.T.O.R.M. em geral. Tivemos a oportunidade de alargar os nossos conhecimentos em observação astronómica, nomeadamente no campo da rádioastronomia.

Aprendemos a manejar alguns dos equipamentos de alta tecnologia e software utilizados no observatório e podemos fazer as nossas próprias observações de pulsares. Alem disso tivemos a oportunidade de assistir ao trabalho de alguns astrofísicos e astrónomos.

Assistimos a algumas sessões teóricas ministrados pelo Prof. Marek Demianski onde ficamos a conhecer alguns dos tópicos mais recentes no estudo das estrelas de neutrões e pulsares.

 Esperamos ter exposto com este relatório uma síntese dos conhecimentos adquiridos e das actividades desenvolvidas durante a visita ao rádiobservatório de Torun.

 

10-Agradecimentos

·      Ao Centro de Ciência e Tecnologia da Madeira (C. I. T. M. A.) por nos ter suportado a viagem e concedido uma bolsa, ajudas sem as quais não nos seria possível ter efectuado esta visita de trabalho.

·      Ao Prof. Dr. Marek Demianski pela sua disponibilidade e interesse manifestados desde a primeira hora, pela sua hospitalidade e por ter organizado e orientado de forma superior as nossas sessões de trabalho.

·      Ao Departamento de Física da Universidade da Madeira pelo seu apoio.

·      À Prof. Dr. Hanna Nencka mentora de todo o projecto e elo de ligação entre as várias partes envolvidas por nos ter conseguido esta oportunidade de alargarmos os nossos conhecimentos.

  

11-Bibliografia

D.R. Stineberg , V.N. Kaspi , D.J. Nice , N.F. Ryba , J.H. Taylor , S.E. Thorsett , T.H. Hankins : ¢A Flexible Data Acquisition System For Timing Pulsars¢ , Princeton University e New Mexico Institute of Mining and Technology , February 1992 .

David J. Nice : Pulsar Monitoring Telescope , Princeton University , April 1989 .

Steven Weinberg , Gravitation and Cosmology (John Wiley and Sons Inc , New York 1972 ) .

 

ANEXO 1 - RESULTADOS OBTIDOS

ANEXO 2 - CATÁLOGO DE SINAIS DE PULSARES

ANEXO 3 - CATÁLOGO DE INTENSIDADES DE PULSARES

ANEXO 4 - RÁDIOTELESCÓPIO RT4