UNIVERSIDADE DA MADEIRA

GRUPO DE ASTRONOMIA


Sextas Astrónomicas


Sexta-feira Astronómica - 6

Data: 27-04-2007

Assunto: O efeito Yarkovsky-O'Keefe-Radzievskii-Paddack

A sexta Sexta (!!) Astronómica realizou-se no passado dia 27 de Abril. Como de costume, reunimo-nos às 20h00 à entrada da UMa. Estávamos lá eu (Elder), o Ilídio, o professor Laurindo e o Adrian. O professor Pedro ficou de ir ter connosco ao restaurante mais tarde. Desta vez, para variar, fui eu que me atrasei um pouco...

As nuvens que cobriam o céu no início da noite anteviam a ausência de condições para a segunda parte da noite, mas a esperança era a última a morrer. O tema por mim proposto era uma pequena discussão e divulgação do efeito YORP entre os elementos do Grupo de Astronomia da Universidade da Madeira (GAUMa). Este tema era muito actual pois recentemente (em Março) haviam sido publicados dois artigos independentes que demonstravam a actuação do efeito YORP num pequeno asteróide, o (54509) 2000PH5 e ainda de um terceiro, menos divulgado que dava conta da confirmação do mesmo efeito no asteróide 1862 Apollo. Como este não oferecia tanta informação para discutir como o asteróide PH5, a discussão centrar-se-ia neste último.

Chegamos então ao restaurante e após escolhermos o que iríamos jantar comecei por apresentar o tema. Sendo este asteróide descrito como tendo uma órbita em ferradura, logo surgiu a dúvida se não se trataria do asteróide Cruithne. Deixou-se esta questão para ser investigada na segunda parte da noite, caso não conseguíssemos fazer as observações planeadas. Então, enquanto aguardávamos o jantar, a discussão foi lançada com a distribuição de material sobre o tema. As primeiras perguntas que surgiram andavam à volta de: Mas...o que é o efeito YORP? Em que consiste? Quais os efeitos que provoca nos objectos do Sistema Solar?

Tentarei, pois, não me limitar a fazer um resumo do que se passou nesse início de noite e sim descrever o efeito e os seus mecanismos: YORP é um acrónimo para Yarkovsky-O'Keefe-Radzievskii-Paddack que em inglês custa imenso a pronunciar. A propósito, falámos no jantar também sobre um exemplo semelhante, da Cosmologia, em que se usa o acrónimo FLRW para designar a métrica do espaço-tempo do modelo actual de Universo inflaccionário com Big Bang. Esse acrónimo também diz respeito a quarto autores que, ao longo das décadas, foram estabelecendo a mértrica em vários artigos: Friedmann-Lemaître-Robertson-Walker.

O efeito YORP, que se pode explicar muito rapidamente como sendo resultante da transmissão de momento linear a um astro por parte da radiação electromagnética incidente sobre ele, produz resultados que puderam ser detectados recentemente no asteróide (54509) 2000PH5 recorrendo a observatórios ópticos e a radiotelescópios como o de Arecibo (300m) e o de Goldstone. Notou-se que o asteróide está aumentando a sua velocidade de rotação 1 milésimo de segundo ao ano. Este efeito é mais preponderante em objectos pequenos (114m no asteróide em estudo) e com formas irregulares. Com uma magnitude aparente à volta de 24, este asteróide está muito além do limite de magnitude do Meade LX200 do GAUMa (que chega, na melhor das hipóteses, às 15 magnitudes).

A explicação do YORP pode ser feita com analogias simples a efeitos que todos nós já conhecemos. O solo e as pedras estão mais quentes no início da noite do que ao amanhecer. A simples constatação deste facto levou à formulação da hipótese de que a luz do Sol deveria ser capaz de levar alguns asteróides a girar cada vez mais rápido (teoria de Yarkovsky). A teoria agora está confirmada por observações. Os asteróides re-emitem a luz do Sol sob a forma de radiações infravermelhas, ou calor, do seu lado "escuro", enquanto giram. Esta re-emissão causa uma pequeníssima propulsão, que é explicada pela teoria de YORP. Ao devolver o calor do Sol ao espaço, segundo Stephen Lowry "o asteróide acaba por ser ligeiramente empurrado na direcção oposta".

Naturalmente que é um processo muitíssimo lento! A equipa de Lowry detectou um aumento na taxa de rotação do asteróide 2000PH5, com um raio de 114 metros. A aceleração dá-se a valores mínimos, mas constantes. Pensa-se que o asteróide PH5 irá duplicar a sua velocidade de rotação dentro de 550 mil anos. Obviamente que o efeito YORP pode funcionar ao contrário, desacelerando um asteróide! Tudo depende de detalhes e pequenas irregularidades na superfície do asteróide. Daí que a (ir)regularidade da superfície dos asteróides seja tão importante.

E isto foi salientado durante o jantar, pois analisando mais atentamente o material distribuído estudaram-se algumas imagens de radar do asteróide e o seu modelo equivalente e notou-se uma óbvia irregularidade da sua superfície. De facto, o período de rotação do PH5 é elevado, cerca de 12 minutos, e está a diminuir. Este efeito é mais preponderante nos asteróides pequenos pois são os mais irregulares. Os maiores asteróides já possuem formas menos irregulares e, portanto, não são tão vulneráveis ao YORP.
 


Figura 1 : Órbita do asteróide 54509 YORP (2000 PH5).
 

Estudos e observações demonstram que asteróides maiores que 125 km têm taxas de rotação não muito grandes, enquanto que asteróides ligeiramente mais pequenos já demonstram um pequeno número de "apressados". Os asteróides mais pequenos mostram um grande número de asteróides muito rápidos ou muito lentos e isto torna-se cada vez mais evidente à medida que se estudam populações de asteróides cada vez mais pequenos. Tendo este asteróide sido descoberto em 2000, cedo se pensou em estudá-lo com vista à obtenção de dados para estudar a possibilidade de o efeito YORP ser responsável pelo seu muito rápido período de rotação. Em 2001 começaram os estudos. Foi uma campanha observacional de monitorização fotométrica em grande escala. O estudo decorreu durante 4 anos. Muitos observatórios de vários países contribuíram, incluindo os telescópios de Calar Alto em Espanha, o observatório de Ondrejov na República Checa e o ESO no Chile, entre outros. Cada telescópio estava equipado com detectores CCD modernos e filtros ópticos standard (normalmente o V ou o R que estão centrados em 550 nm e 697 nm, respectivamente).
 

Figura 2 : Deslocação do asteróide 2000 PH5

Um vídeo do deslocamento do asteróide contra o pano de fundo de estrelas pode ser encontrado em:

http://www.eso.org/public/copyright.html?target=/public/outreach/press-rel/pr-2007/video/vid-11-07.mov&source=http://www.eso.org/public/outreach/press-rel/pr-2007/phot-11-07.html

Com estes estudos no óptico, detectou-se uma variação no período de P/P= -1.7*10-6 (± 9%) por ano. Já com a tecnologia de radar foi possível fazer modelos com base nas reflexões do sinal. Estas reflexões permitiram obter os seguintes modelos:


Figura 3 : Asteróide 2000PH5 (visto de vários ângulos).

 


Figura 4 : Asteróide 2000PH5.


Naturalmente que muito mais havia a dizer, mas o jantar chegou ao fim e dirigimo-nos à universidade na esperança de ainda fazermos algum "trabalho de campo" mas o tecto de nuvens que se encontrava sobre o Funchal na altura, não o permitiu. Limitamo-nos a confirmar que, de facto, o 2000PH5 não era o asteróide Cruithne (que tem um número bem mais baixo: 3753), apesar de ter também, como este último, uma aparente órbita em ferradura (crédito Australian SpaceGuard Survey):


Figura 5 : Órbita do asteróide Chruithne.

A órbita de Cruithne, como a do 2000PH5 e outros, é estranha mas não tanto quanto aparenta! Na Figura seguinte (crédito JPL) apresenta-se o caso do 2002AA29, com a órbita vista de lado (topo) e de cima (em baixo).


Figura 6 : Órbita do asteróide 2002AA29 vista de lado.

 


Figura 7 : Órbita do asteróide 2002AA29 vista de cima.

A noite terminou pela 1 da manhã, altura em que abandonamos a Universidade.

Elder Samuel Macedo Pinto
Pedro Augusto


Referências:

http://www.sciencemag.org/cgi/content/full/1139038/DC1
http://www.sciencemag.org/cgi/content/full/1139040/DC1
http://en.wikipedia.org/wiki/Yarkovsky_effect
http://en.wikipedia.org/wiki/Radiation_pressure
http://www.eso.org/public/outreach/press-rel/pr-2007/pr-11-07.html

> © 2007 Grupo de Astronomia da Universidade da Madeira

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